A música na Grécia Antiga

A música na Grécia AntigaFalar sobre a música grega na antiguidade ainda significa andar por caminhos não muito iluminados. Através dos trabalhos e pesquisas em campos como a história e a arqueologia, que jogam luz sobre contextos e aspectos cotidianos nos quais a música aparecia, ainda nos falta o essencial. Afinal, como soava a música da Grécia antiga? Como realmente eram os timbres dos instrumentos usados naquela época? Como se cantava? E já que a Grécia é considerada o berço da civilização ocidental, será que a música na antiguidade também guardava relação com a música do ocidente atual, ou está mais próxima das tradições e técnicas do oriente?

Antes de respondermos, ou tentarmos lançar qualquer luz sobre o assunto, vamos entender um pouco do papel da música na antiguidade grega.

A música na Grécia antiga fazia parte da rotina diária das pessoas, estando presente em eventos privados e festividades abertas ao público. Há relatos históricos mostrando a forte presença dela desde o período arcaico, havendo mesmo competições musicais em muitas partes da Grécia Antiga. Havia, por exemplo, a “Karnea”, realizada em Esparta, onde a música aparecia conectada ao treinamento e educação dos jovens.

No século 6 a.C. a música também era parte importante em duas grandes festividades realizadas em Atenas, a primeira delas era a “Megala Panathinea” e a segunda a “Megala Dionysia”. Foi nessas festividades que Atenas despontou como grande expoente cultural, pois além das competições musicais, cresceram a arte poética e o drama antigo.

Além das festividades, a música também estava conectada a eventos cotidianos como casamentos, banquetes, encontros sociais diveros e competições esportivas, dentro das quais também havia competições musicais.

Considerada como remédio para o corpo e para a alma, a música era tida como divina. Na mitologia, as nove filhas de Mnemosine (deusa que personificava a memória) e Zeus chamadas “musas” atestam a importância que os gregos davam à arte musical.

Existe também uma relação muito próxima entre a música e ciências como matemática e filosofia, ocupando a música uma grande siginifância na educação dos jovens.

Convém destacar, ainda, que estudos apontam que obras grandiosas da literatura como os épicos de Homero (Ilíada e Odisseia) e as tragédias gregas não teriam sobrevivido ao tempo sem a contribuição da música. A Ilíada teria sido preservada graças às tradições orais na Grécia Antiga que datam desde o século 13 a.C. Já os poemas de amor da poetisa Safo e as tragédias de Sófocles e Eurípedes, foram originalmente e simplesmente músicas! Foram compostas para serem cantadas no todo ou em parte.

Apesar de toda a importância e de todo o prestígio que a música parece ter tido na Grécia Antiga, pouca coisa concreta sobrou dessa época para nos dar uma ideia clara de como ela soava. O professor e música da Universidade Oxford Armand D’Angour compara esse vazio a termos perdido toda a sonoridade das canções dos Beatles daqui a, digamos, 2500 anos! Imaginem se dessas canções sobrassem apenas as letras, ou que tudo o que sobrasse das óperas de Mozart ou Verdi fossem as palavras e não a sonoridade musical. É mais ou menos isso o que ocorre com a música da antiguidade grega, um período que abrange milhares de anos, praticamente mudos para nós, infelizmente.

No entanto, nem tudo foi perdido. Exemplos disso são alguns exemplos de notação musical bastante antiga encontrada nos chamados hinos délficos. Mas o que sobrou deles foram apenas fragmentos.

Em situação diferente está o epitáfio de Seikilos, uma lápide datada entre 200 a.C e 100 d.C encontrada perto de Aidin, localidade não muito distante de Éfeso, na atual Turquia. O epitáfio é o mais antigo exemplo de uma composição musical completa. Além da letra, encontramos na lápide a notação musical utilizada na época, fato que levou muitos estudiosos a tentarem reconstruir a sonoridade do mundo musical grego antigo. Enfim, ruídos surgem em meio a toda mudez da antiga Grécia.

Mas, será que é possível reconstruir uma música da qual só nos sobraram fragmentos, tocadas por instrumentos os quais nunca ouvimos? Segundo o professor Armand D’Angour, a resposta é sim.

“O ritmo – talvez o aspecto mais importante da música – está preservado nas palavras em si, nos padrões de sílabas longas e curtas. Os instrumentos são conhecidos por suas descrições, pinturas e achados arqueológicos, que nos permitem estabelecer os timbres e o alcance das notas que eles produziam.”

Ele explica ainda:

“… novas revelações sobre a música grega antiga emergiram de alguns documentos antigos nos quais há inscrições de uma notação vocal criada ao redor de 450 a.C., consistindo de letras do alfabeto e sinais colocados acima das vogais das palavras gregas. Os gregos elaboraram a razão matemática dos intervalos musicais – uma oitava é 2:1, uma quinta 3:2, uma quarta 4:3, e assim por diante. A notação dá uma indicação correta da altura relativa: a letra A no topo da escala, por exemplo, representa uma nota musical que é uma quinta mais alta do que a letra N, que está do meio para o fim do alfabeto”

Assim, por exemplo, estudos levaram a reconstrução sonora do epitáfio de Seikilos, do qual falamos há pouco. Trata-se de um curta canção de apenas quatro linhas que pode ser traduzida para o português assim:

“Enquanto viveres, brilha
E de todo não te aflijas
A vida é curta
E o tempo cobra suas dívidas”

A notação, aliás, bastante clara, marca um ritmo bastante regular, familiar aos nossos ouvidos. D’Angour explica que na música grega antiga a voz subia de tom em certas sílabas e caía em outras.

Na questão da afinação também havia algumas particularidades. Ptolomeu, no século 2 d.C., fornece relações matemáticas precisas para numerosas afinações diferentes, incluindo uma que ele diz soar “estranha e caseira”. Tocadas em instrumentos antigos algumas dessas afinações lembram mais as escalas exóticas da música oriental do que as do ocidente.

Abaixo você pode ouvir o trabalho de David Creese, um estudioso de antiguidade clássica da Universidade de Newcastle, tocando e cantando o epitáfio de Seikilos numa espécie de cítara de oito cordas e pontes móveis.

 

Exemplos atuais

Na discografia grega ainda podemos encontrar alguns exemplos muito interessantes de reconstrução da música antiga. Em 2006 a cantora Eleftheria Arvanitaki gravou o álbum “Grigora i ora perase” (O tempo passou rápido), no qual ela interpreta algumas canções cujas letras foram baseadas nos poemas de Safo, que viveu entre os séculos 7 e 6 a.C. Uma das mais lindas do álbum se chama “Pyretos kryfos” (Uma febre encoberta), que você poderá ouvir no vídeo abaixo.

Este artigo foi escrito para presentear os diversos visitantes que diariamente chegam a este site procurando algo sobre música na Grécia Antiga. Tentei ser o mais claro possível e me basear em artigos disponíveis na rede. A reprodução é permitida, mas se você postar o texto no seu site ou blog, por favor, coloque um link nele para este artigo.

 

Referências:

D’Angour, Armand. How did ancient Greek music sound? (Visualizado em 05 de junho de 2014. Disponível em http://www.bbc.com/news/business-24611454)

Music in Ancient Greece. (Visualizado em 05 de junho de 2014. Disponível emhttp://www.lyravlos.gr/ancient-greek-music-en.asp)

Epitáfio de Seikilos. (Visualizado em 05 de junho de 2014. Disponível emhttp://pt.wikipedia.org/wiki/Epit%C3%A1fio_de_Seikilos)

2 comentários em “A música na Grécia Antiga”

  1. anacletocamaraaraujo@gmail.com disse:

    Essas musicas gregas me encanta traz inspiração. Boa noite

    1. marcelo disse:

      Que legal, Anacleto! Obrigado pela mensagem!

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